Em uma tentativa inédita de coordenar e otimizar as operações, o Primeiro Comando da Capital (PCC), uma das facções criminosas mais influentes do Brasil, adotou um “Censo do Crime” que tem mudado o cenário do tráfico e das quadrilhas no país.
A informação foi revelada após estudos recentes da pesquisadora Camila Caldeira Nunes Dias, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Um documento publicado neste ano destaca a meticulosa abordagem do PCC para mapear e entender a dinâmica do crime organizado.
A pesquisadora verificou que o “Censo do Crime” do PCC é uma ferramenta crucial para a facção e visa coletar e sistematizar informações detalhadas sobre outros grupos criminosos nas respectivas áreas de atuação.
Os levantamentos identificam grupos como “amigos”, “inimigos” ou “neutros” e, muitas vezes, incluem o número aproximado de integrantes das quadrilhas. Efetuado mensal ou bimestralmente, os censos não só monitoram a presença e o poder dos concorrentes, mas também ajudam na formulação de estratégias e alianças, o que consolida a influência do PCC.
No estudo, a pesquisadora Camila Caldeira Nunes Dias destacou que o “Censo do Crime” reflete o processo de faccionalização que tem ocorrido no Brasil, nas últimas décadas. O país vivenciou uma intensificação das dinâmicas prisionais e criminais, acentuada pela polarização entre o PCC e o Comando Vermelho (CV) a partir de 2016. A ruptura entre as duas facções gerou uma guerra por territórios e mercados ilícitos, o que impacta diretamente para os índices de violência no país.
Região Norte
Na região Norte do Brasil, o “Censo do Crime” é especialmente relevante devido à posição estratégica da área nas rotas internacionais de narcóticos.
A região, com vastas áreas e baixa densidade populacional, tornou-se um campo fértil para disputas entre facções, como o PCC e a Família do Norte (FDN), além de grupos colombianos e peruanos.
As disputas na Tríplice Fronteira Norte – formada por Brasil, Colômbia e Peru – exemplificam a complexidade das relações entre as facções, onde alianças e rivalidades fluem e, frequentemente, levam a confrontos violentos.
O relatório da pesquisadora também revela que, enquanto o PCC adota uma estrutura centralizada e disciplinada, o CV usa um modelo de expansão baseado em “franquias”, o que permite uma rápida expansão das atividades, mas com menor controle das ações.
Essa diferença estrutural se reflete na forma como cada facção atua e se expande e afeta diretamente a dinâmica criminal do país.
Ainda segundo o estudo, o “Censo do Crime” do PCC, apesar das limitações e da necessidade de cautela na interpretação das informações do documento, evidencia uma tentativa da facção para manter o controle e a organização em um cenário de crescente complexidade e violência. A análise detalhada dos dados ainda crucial, de acordo com a pesquisadora, para compreensão do panorama do crime organizado e formulação de políticas públicas de segurança mais eficazes.